sexta-feira, 9 de novembro de 2007

A Copa (verde) do Mundo é Nossa!

Diplô Brasil estréia coluna sobre Responsabilidade Social. Primeiro número avalia: emergência da questão ambiental foi decisiva para o retorno do mundial de futebol ao país. Mas haverá mobilização real em favor da natureza, ou tudo se resumirá a marketing vazio?

Luiz André Ferreira

Eram 90 milhões em ação, cantando sob a regência da ditadura o refrão ufanista “pra frente Brasil”. O hino da Copa de 1970 (no México) acabou embalando um dos poucos “gols dentro” feitos pelo país durante o regime militar: trazer o tricampeonato para casa, depois de 58 (Suécia) e 62 (Chile). Essa performance só foi repetida no Brasil já democratizado com os campeonatos de 1994 e 2002. O que chama a atenção é que apesar do know-how internacional neste esporte, o “melhor do mundo no futebol” nunca conseguiu reproduzir sua habilidade fora das quatro linhas. Depois de 1950, foram 64 anos de jejum, com inúmeras tentativas de voltar a sediar o mundial, finalmente anunciado para 2014. Na ocasião, ao invés dos 90, pularemos 197 milhões de habitantes, segundo as estimativas.

O Brasil sempre recebia cartões vermelhos, em sua intenção de voltar a ser anfitrião de uma Copa. As principais peças tabuleiro desse jogo político envolviam o lobby esportivo internacional e gols contra cometidos pelo país nos quesitos sociais e de infra-estrutura: transporte, segurança, saúde, organização. Em tais aspectos, não mudamos em nada. Até regredimos, defendem os mais saudosistas: apagão aéreo, malha ferroviária enferrujando, estradas e vias urbanas sem investimentos, a dengue e hospitais públicos assombrando o nosso cotidiano...

Se esses entraves continuam jogando contra a nossa vida, o que mudou nas escolhas dos “cartolas internacionais”? Como resposta, a entrada em campo de um artilheiro digno da seleção de Pelé e Garrincha: o meio-ambiente. A camisa verde brasileira foi o grande trunfo que venceu os fracassos das tentativas anteriores. Tanto que já temos reescalação garantida, para a disputa pelas Olimpíadas de 2016. A prova da confiança brasileira neste artilheiro foi o fato de amazonense Eduardo Braga ter sido escolhido como orador, entre os doze governadores brasileiros que seguiram em um “trem da alegria”, para Zurique, onde a Fifa anunciou o local da Copa 2014. Recebendo em troca a garantia da disputa de um dos jogos em Manaus, Braga tomou em defesa a plataforma política montada pela CBF, que prevê a preservação da floresta como compensação para emissão de gases do efeito estufa emitidos durante a realização da Copa de 2014. “O Mundial brasileiro será o primeiro megaevento a reunir bilhões de pessoas em torno da preservação do meio-ambiente e do combate ao aquecimento global. Contribuirá com o desenvolvimento sustentável e ajudará na conservação deste insubstituível patrimônio ambiental”, defendeu Braga. A atuação parece que conquistou o presidente da Fifa, Joseph Blatter, que declarou ter ficado impressionado com a preocupação ambiental brasileira.

Como toda corrida eleitoral, o Brasil preparou sua propaganda audivisual. Um vídeo institucional vem circulando entre os dirigentes esportivos e imprensa internacionais. O material usa e abusa das belezas naturais brasileiras, do apelo turístico e ações sociais do governo Lula. Entre essas imagens da “ilha da fantasia” não constam os problemas de infra-estrutura do país, muito menos as queimadas, desmatamentos e conflitos sociais vividos pelos povos da floresta, usada como garota-propaganda.

Essa campanha política segue com a mesma plataforma para a disputa pelas Olimpíadas. E agrega ainda como ponto forte os Jogos Pan Americanos do Rio. Não resta a menor dúvida do sucesso, por conta da hospitalidade e da vocação carioca para a realização de grandes eventos. A cidade sediou a conferência Rio 92, além dos anuais Carnaval e Reveillon de Copacabana — que reúne quase quatro milhões de pessoas pacificamente, numa mesma praia, sem grandes incidentes (o que seria impensável em outras populações que se auto-consideram civilizadas)...

Mas não podemos deixar de lembrar que a campanha vitoriosa para conquistar o Pan também baseou-se no meio-ambiente. O Brasil prometia a tão propagada despoluição da Baía de Guanabara e investir em melhorias na saúde e na infra-estrutura de transportes, como forma de diminuir o tempo de deslocamento e a emissão de CO2. E o que vimos? A bela baía continua suja. O mapa de ampliação dos transportes não-poluidores não foi seguido. A ampliação do metrô acabou minguando. A revitalização do trem e das barcas não saiu da cartilha apresentaras ao Comitê Olímpico Internacional. E a saúde? Após todo o aparato para o Pan, o primo pobre que veio em seqüência, o Para-Pan (que devido ao preconceito ficou sem o patrocínio de grandes seguradoras de saúde e sem um programa de atendimento governamental) fechou com a triste mancha do episódio do atleta que sofreu um AVC após perambular, sem atendimento, por vários hospitais públicos, assim como muitos brasileiros no nosso dia-a-dia.

http://diplo.uol.com.br/2007-11,a2007

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